quarta-feira, 9 de setembro de 2015

#Crônica05 - Sonhos

Um homem, Aloísio, tinha o estranho sonho de, um dia, jogar-se de um prédio de trinta andares. Sem questionamentos, por favor.
Sem pressa para realizar tal desejo, ele andava pelas ruas a caminho do trabalho admirando as grandes construções pela cidade, procurando alguma que o agradasse mais. Parecia até uma criança que, pela primeira vez, vê um avião passar no céu: cabeça erguida e sorriso bobo. Algumas pessoas até encaravam aquela situação como algo idiota. “Que cara estranho”, diziam alguns garotos. “Deve estar querendo abraçar os prédios”, dizia uma senhora, rindo. Aloísio nem sempre ouvia, e quando ouvia, ignorava.
Era casado. Julieta sempre soube que o marido tinha tal sonho, porém nunca ligou muito; ela encarava aquilo como uma brincadeira. Sempre duvidou da capacidade do marido de cometer aquele ato, mas ficava muda diante das situações em que ele contava tal fato sobre si em reuniões de família ou trabalho.
Até que um dia Aloísio começou a colecionar uma série de matérias de jornais e revistas, procurando onde pudesse encontrar reportagens, textos e crônicas sobre suicídio, sobre se jogar de prédios e monumentos etc. A partir desse momento, Julieta descobriu que poderia ficar viúva mais rápido do que esperava.
Um dia, quando Aloísio saía para o trabalho, ela disse que o acompanharia até a igreja ─ que ficava no caminho. De certo, ela queria conversar com Deus para colocar algumas porções de juízo na cabeça do marido.
Enquanto ela estava na igreja, o marido, indo para a repartição em que trabalhava, acabou mudando de rumo e adentrando um prédio para o qual sempre olhava quando passava por ali. O porteiro não ligava muito para quem entrava ou saía, então Aloísio conseguiu pegar facilmente um elevador até o último andar do edifício, tendo que usar uma escada para chegar ao terraço.
Na rua, as pessoas não prestavam tanta atenção ao que acontecia lá em cima. Talvez estivessem ocupadas demais com seus celulares, com os horários que tinham a cumprir ou rezando em suas igrejas cinzentas de vitrais coloridos pelos maridos ou esposas que sofriam de supostos distúrbios mentais.
Aloísio, em seus quarenta anos de vida, nunca conseguiu entender ao certo o porquê de as pessoas não acreditarem no seu sonho. Todo sonho deve ser realizado, deve ser cumprido e, quem sonha, tem a obrigação de cuidar para que aquele desejo se concretize. Qual era a dificuldade em entender isso?
Ele posicionou-se no parapeito. Encarou o céu, da mesma forma como encarava o prédio, outro dia, como uma criança.
Ele enxergava as nuvens, os pássaros, o sol e a cidade toda. Enxergava os outros prédios, casas, carros, árvores e praças. Enxergava as pessoas, e, dali de cima, elas não passavam de seres insignificantes que não pensam direito.
O louco não era ele.
Sorriu.
Um impulso para frente, ele caiu. Mas caiu sorrindo.

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